Na última semana, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) celebrou um acordo com o iFood para incentivar a competição no mercado de marketplace de delivery on-line de comida, buscando assim melhores condições para os usuários do serviço, facilitando a entrada de novos aplicativos no mercado. O Cade é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que zela pela livre concorrência como forma de gerar melhores condições para os consumidores, evitando concentração econômica e cartéis.
O termo assinado entre Cade e iFood traz algumas ponderações sobre os contratos de exclusividade firmados entre o aplicativo e bares e restaurantes parceiros. O superintendente-geral do Cade, Alexandre Barreto, explica os principais pontos do documento. “O acordo gira em torno de três grandes eixos: a iFood fica impedida de celebrar contratos de exclusividade com grandes redes; também há uma limitação no número de contratos de exclusividade que a empresa pode ter; e além disso também estabelece um período de quarentena mediante ao qual ao fim de um contrato entre iFood e um determinado estabelecimento vai correr um período de até um ano onde não pode haver um contrato de exclusividade com o mesmo estabelecimento. A expectativa é que dessa forma tenhamos condições para que haja uma concorrência saudável e justa nesse mercado”.
Ainda sobre o acordo, o vice-presidente de restaurantes do iFood, Arnaldo Bertolaccini, elucida sobre os contratos de exclusividade da plataforma e como o acordo impacta os consumidores: “O que é importante frisar inicialmente é que o Cade reconhece que os contratos de exclusividade que nós operamos até hoje são legais, que foram fonte para viabilizar investimentos nos restaurantes que operam na nossa plataforma e ainda geram eficiência para os restaurantes e também para os consumidores. E com o fim de alguns contratos de exclusividades, o iFood e os restaurantes impactados precisarão sim renegociar as taxas que eram oferecidas com desconto em troca de uma exclusividade. Essa conversa vai ter que acontecer, vamos conversar com cada restaurante e explicar como serão essas novas condições comerciais. Elas devem se aproximar das taxas praticadas usualmente, as taxas sem desconto, e isso poderá ser repassado ao consumidor final”.
Segundo a análise do Cade, existem indícios de condutas do iFood que estariam elevando barreiras à entrada de novos concorrentes no mercado, pois este estaria abusando de sua posição dominante, por meio da imposição de compromissos de exclusividade aos restaurantes e outras práticas com a mesma finalidade. Durante a investigação para apurar a existência de condutas anticoncorrenciais, o conselho e o aplicativo estabeleceram um acordo.
“Após meses de investigação, houve a iniciativa de celebração de um acordo, que levou mais alguns meses de conversações e tratativas, no qual se redundou em medidas que o Cade entende como suficientes para reduzir o risco de fechamento de mercado que tenhamos melhores condições de serviço, menores preços, enfim, que a concorrência aconteça para que surta os efeitos positivos e desejados para a população”, elucidou Barreto.
Segurança jurídica
O diretor-executivo da Associação Nacional dos Restaurantes (ANR), Fernando Blower, destaca que para o setor é importante estar resguardado pela legislação. “O mais importante, independentemente do conteúdo em si da decisão do acordo entre o Cade e o IFood, é que daqui pra frente nosso setor passe a ter segurança jurídica sobre quais serão os parâmetros desses contratos, de tal forma que todos os atores – sejam restaurantes, operadores em geral, sejam as próprias plataformas concorrentes – saibam como esse mercado passa a se configurar, e a gente espera que nós próximos meses haja uma reconfiguração, e a gente consiga perceber melhor os impactos ao longo do tempo”, afirmou.
Já o presidente-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, detalha o impacto da decisão no delivery de forma geral, e como isso pode ajudar outros players a atuarem no mercado brasileiro de entrega de comida via aplicativo: “A decisão do Cade, de restringir os contratos de exclusividade do iFood, é muito importante. Ela permitirá que o mercado possa superar algumas das barreiras à concorrência que estão afastando do mercado brasileiro empresas do porte de uma Uber Eats, que saiu em março passado alegando incapacidade de concorrer com as barreiras que hoje existem no mercado. O Cade acerta muito ao limitar essas barreiras”.
Solmucci ainda evidenciou quais as medidas impostas pelo Cade ao iFood que são mais benéficas aos consumidores finais e também aos bares e restaurantes: “Quando permite que outras plataformas tenham acesso às empresas, principalmente às grandes redes, que não mais serão exclusivas do iFood, também coloca limite na participação nas grandes cidades, porque um consumidor que olha para a plataforma entrante e não encontra as suas marcas prediletas evidentemente não usará essa plataforma, favorecendo a plataforma dominante que pratica preços altíssimos para os bares e restaurantes, prejudicando aos consumidores”.
E finalizou o presidente-executivo da Associação: “A Abrasel recebeu com grande euforia a atuação do Cade que, além de competente ao promover uma concorrência mais justa no mercado, também ocorreu de maneira tempestiva, ou seja, salvou o ano. Grandes empresas poderiam desistir do mercado de delivery no Brasil caso essa decisão não viesse a ocorrer”.
O Cade busca, da forma menos intervencionista possível, promover a livre concorrência nos diversos setores da economia, evitando concentração econômica, condutas anticoncorrenciais e a combinação de preços, prática conhecida como cartel.